Os gastos mínimos com
saúde e educação exigidos pela Constituição vão consumir todo o espaço das
despesas não obrigatórias e comprometer o dinheiro destinado ao custeio e ao
investimento nas outras áreas da União até 2028, tornando o orçamento
impraticável de acordo com projeções feitas pelo governo.
Elas mostram que pisos de
saúde e educação vão consumir 112% das despesas não obrigatórias até 2028.
Mantidas as regras
atuais, faltaria dinheiro para o programa Minha Casa, Minha Vida, recuperação
de rodovias federais, pagamento do Auxílio Gás a famílias carentes, obras de
saneamento básico, ações de Defesa Civil para prevenir desastres naturais e
manutenção de todos os órgãos federais.
O cenário foi antecipado
pelo Estadão no dia 21 de abril com estimativas do piso da saúde. Agora, a
reportagem obteve projeções do Ministério do Planejamento via Lei de Acesso à
Informação que confirmam a tendência e apresentam um cenário ainda mais desafiador,
com a inclusão dos gastos com educação e a distribuição do dinheiro no
Orçamento.
Ao mesmo tempo que
despesas obrigatórias e impositivas pela Constituição crescem, entre elas
aposentadorias, emendas parlamentares, saúde e educação, o arcabouço fiscal
impõe um limite para os gastos públicos (2,5% de crescimento real em relação ao
ano anterior), o que diminui o espaço para investimentos em outras áreas.
A Constituição determina
um gasto mínimo com saúde e educação atrelado à receita. A saúde tem 15% da
Receita Corrente Líquida (RCL) e a educação tem garantia de 18% da Receita
Livre de Impostos (RLA). O dinheiro serve para custear a manutenção de postos de
saúde, hospitais, escolas e universidades, além de novos investimentos nos dois
setores.
Pisos de saúde e educação
vão consumir 112% das despesas não obrigatórias até 2028
Os pisos de saúde e
educação vão somar R$ 336,3 bilhões em 2025, de acordo com as projeções do
governo. O dinheiro é dividido entre despesas obrigatórias e discricionárias
(não obrigatórias). Os recursos vão consumir 44% do orçamento disponível para
todas as despesas não obrigatórias, espaço disputado com outras áreas. O
porcentual subirá para 51% em 2026, 63% em 2027 e 112% em 2028.
Em 2027, sobrariam apenas
R$ 45 bilhões para gastos não obrigatórios nas outras áreas, um cenário
considerado impraticável por integrantes do governo e economistas. Em 2028,
faltariam R$ 12 bilhões para custeio e investimento em outras áreas,
paralisando o Orçamento. Isso significa que o governo terá de rever os gastos
mínimos com saúde e educação ou mexer no arcabouço fiscal.
Dentro das despesas não
obrigatórias, há dois tipos de programações: custeio (manutenção de órgãos e
serviços públicos) e investimentos (obras e equipamentos). Como os
investimentos ainda têm um mínimo exigido pelo arcabouço, que é de 0,6% do
Produto Interno Bruto (PIB), as despesas que correm mais risco são as de
custeio: manutenção de todos os ministérios, autarquias e órgãos federais,
Auxílio Gás e ações de Defesa Civil, entre outras.
Revisão de gastos não tem
consenso dentro do próprio governo
Integrantes da equipe
econômica defendem uma revisão dos pisos de saúde e educação. O Tesouro
Nacional tem estudos para alterar o índice que reajusta o crescimento dessas
despesas, saindo de porcentuais vinculados à arrecadação e partindo para um
mínimo vinculado ao crescimento da população ou do Produto Interno Bruto (PIB).
Na prática, as mudanças poderiam tirar até R$ 131 bilhões da saúde e educação
até 2033, distribuindo o recurso para outras áreas.
Internamente, os
ministérios da Saúde e Educação não querem rever os pisos atuais, argumentando
que um crescimento menor compromete os investimentos nas duas áreas e a
manutenção das unidades de saúde e de ensino nos próximos anos. Não há consenso
no governo. As bancadas dos dois setores no Congresso também são contra, assim
como parlamentares do PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em entrevista ao Estadão,
na última quinta-feira, 9, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que
não vê muito espaço para a desvinculação dos benefícios previdenciários (do
salário mínimo) e que a discussão sobre rever os pisos de saúde e educação “não
prosperou” no governo.
A ministra do
Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, defende uma revisão dos gastos
obrigatórios, incluindo um plano para desvincular os benefícios da Previdência
Social do salário mínimo. “Ninguém está falando em mexer em nada em 2024 e
2025. O meu papel é mostrar que, a partir de 2026, nós começamos a não ter
recursos para as despesas discricionárias livres, tirando emenda parlamentar. A
gente vai para um limite insustentável”, afirmou Tebet ao Estadão na última
sexta-feira, 10.
O Executivo deve elaborar
o Orçamento de 2025 sem mexer nas premissas, mas integrantes da equipe
econômica não veem espaço para manter as regras atuais por mais tempo. “É um
fator de preocupação para nós, é um desafio que já está colocado nesse cenário
de médio prazo e aqui entra a importância redobrada da agenda de revisão de
gastos obrigatórios”, afirmou o secretário de Orçamento Federal, Paulo Bijos,
em coletiva de imprensa no dia 15 de abril.
Estadão Conteúdo
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