A primeira metade do terceiro mandato de Lula (PT) foi marcada por um desempenho ruim no Congresso Nacional, reflexo de um fenômeno político observado há cerca de dez anos e que projeta mais dificuldade para a reta final da gestão.
O desempenho das medidas
provisórias em 2023 e 2024 —a principal ferramenta legislativa do Executivo—
foi o pior da história. Os vetos presidenciais, outro grande instrumento do
governo na área, também tiveram marca histórica negativa.
Um total de 32 vetos
feitos por Lula a projetos aprovados pelo Legislativo foram derrubados total ou
parcialmente por deputados e senadores, que têm a palavra final (o presidente
tem o poder de vetar projetos do Congresso, que por maioria pode derrubar esses
vetos). O número é similar ao de igual período da gestão de Jair Bolsonaro, do
PL (31).
Das 133 medidas
provisórias que Lula editou em 2023 e 2024, só 20 foram aprovadas, com
modificações, cerca de um terço do observado no mesmo período sob Bolsonaro,
que até então detinha o pior desempenho —58 MPs aprovadas de um total de 156.
A maior parte, 76,
caducou sem ter sido votada.
As MPs têm eficácia de
lei desde a edição, mas precisam ser corroboradas pelo Congresso em um prazo de
até 120 dias, caso contrário deixam de valer (antes de setembro de 2001 elas
podiam ser reeditadas indefinidamente, sem necessidade de análise do Congresso).
Contribuíram para esse
resultado a disputa de poder entre Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco
(PSD-MG) sobre a tramitação das MPs, o que travou boa parte delas, e a relativa
pequena presença da esquerda no Congresso —com o controle de apenas cerca de um
quarto das 594 cadeiras.
Mas esses dois fatores
não são os únicos.
Dilma Rousseff 2
(2015-2016), Michel Temer (2016-2018), Bolsonaro (2019-2022) e Lula 3 (2023 em
diante) protagonizaram governos que tiveram na maior parte do tempo uma difícil
relação com o Congresso.
O cenário diferiu da
maior parte dos governos anteriores, que também enfrentaram momentos de
turbulência com o Congresso, mas que na média conseguiram manter uma relação
hegemônica.
Os tempos dos costumeiros
“tratoraços governistas” no Congresso começaram a ruir em 2015, período que
abrigou dois grandes eventos que mudariam o curso da história recente —o começo
da escalada em valores e em impositividade das emendas parlamentares e a
vitória de Eduardo Cunha (MDB-RJ) sobre o governista Arlindo Chinaglia (PT-SP)
na eleição para a presidência da Câmara.
As emendas são hoje o principal instrumento de política dos congressistas, que consomem boa parte do dia a dia e do mandato gerenciando verbas para obras e investimentos em seus redutos eleitorais e costurando blocos locais políticos com governadores, deputados estaduais, prefeitos e vereadores.
Só em 2024, por exemplo,
cada deputado teve ao menos R$ 38 milhões em emendas. Cada senador, ao menos R$
70 milhões. Líderes de bancadas e parlamentares mais influentes direcionam bem
mais que isso.
De 2015 até agora, as
emendas tomaram uma direção ascendente que as levou a superar a casa dos R$ 50
bilhões. Além do aumento no volume, o Congresso aprovou a execução obrigatória
para a maior parte da bolada.
Isso tirou da mão dos
governos o principal instrumento que era historicamente usado para formar
maiorias e cobrar fidelidade no Congresso, o conhecido “toma lá, dá cá”: o
governo só liberava emendas de parlamentares aliados e fiéis, e parlamentares
condicionavam o apoio e o voto a essa liberação.
O empoderamento do
Congresso coincidiu também com a falta de fôlego da esquerda nas urnas e,
consequentemente, a majoritária presença da centro-direita e da direita na
Câmara e Senado.
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